Por Mariana Lozzi
Quem lê a obra de Caio Fernando Abreu não imagina que ele passava a maior parte do tempo dentro de uma redação de jornal. O gaúcho se debruçava sobre uma mesa entulhada de papéis, alheio ao frenesi circundante e compenetrado nos próprios dedos, que batucavam a máquina de escrever. Em meio aos “tecs” metálicos, Caio escreveu mais de dez livros e trabalhou nos jornais e revistas mais influentes do país (Nova, Manchete, Veja, Pop, Correio do Povo, Zero Hora, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo).
Caio F. (como mais tarde viria a assinar seu nome) descrevia o mundo como se tivesse em mãos uma câmera fotográfica capaz de congelar o instante e explorá-lo sob diferentes filtros, texturas e ângulos. Assim como a escrita, sua vida era um tanto cinematográfica: “em 1968, Caio morava no centro de São Paulo, num apê de paredes cor de rosa que, entre seus habitantes, tinha um cara que dormia com uma cobra no banheiro”, escreveu Paula Dip, amiga de Caio e jornalista.
A figura longilínea e amarrotada do jovem Caio F. já dava pistas da ousadia e irreverência que o colocariam dentro da lista de procurados pelo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) durante a Ditadura Militar. Os amigos de Caio o descreviam como um homem culto e elegante que, num piscar de olhos, se transformava em uma fábrica de comentários ferinos.
Apesar de ter exercido a profissão durante 24 anos, Caio nunca se apaixonou pelo jornalismo, embora reconhecesse que o ofício foi essencial para aprender a “enxugar” os excessos de sua escrita. Ele desejava viver exclusivamente para escrever livros e cultivar roseiras. Em 1996, pouco antes de sua morte, lhe perguntaram o que gostaria de ter sido senão escritor, ao que Caio disse, como se a resposta fosse óbvia: “jardineiro”.
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No ano de 1952, era publicado na revista “Comício” um conto inquietante, cheio de figuras de linguagem perturbadoras e palavras deslocadas de seu sentido original. Uma tal de “Tereza Quadros” assinou a matéria. Mal sabiam os leitores da Comício que quem segurava a caneta era Clarice Lispector.
Aquela não era a primeira vez que Clarice exercia o jornalismo. Em 1940, com apenas vinte anos e recém-formada em Direito, a jovem Clarice bateu na porta da redação do “Jornal do Brasil” e pediu um emprego com um jeito de “tímida ousada”, como ela mesma ainda descreveria. Antes disso, já havia conseguido com que os contos “Triunfo” e “Eu e Jimmy” fossem publicados em outras revistas e trabalhou como tradutora no temido DIP (Departamento de Imprensa e Censura).
Dois anos e diversos contos depois, Clarice recebe seu primeiro registro profissional como redatora do jornal “A noite” e publica seu romance de estreia “Perto do Coração Selvagem”, aclamado pela crítica.
A carteira de trabalho de Clarice, tirada em 1943
Aos 23 anos, Clarice se casa com um diplomata e passa os próximos dezesseis anos de sua vida viajando pelo mundo. Durante esse tempo, ela não abre mão do jornalismo tampouco da escrita: escreve no jornal Comício para a página “Entre Mulheres”, assinando o pseudônimo de Tereza Quadros e publica três livros: O lustre, A cidade sitiada e A maçã no escuro. Em 1959, Clarice Lispector separa-se do marido, volta para o Brasil e, sob o novo pseudônimo de “Helen Palmer”, escreve uma coluna feminina no Correio da Manhã.
O registro de jornalista, tirado em 1968
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Renato Manfredini escolheu o curso de “Comunicação Social” no vestibular de 1977. Nascido no mesmo ano da inauguração de Brasília (1960), o garoto já escrevia letras de música e sonhava em formar uma banda de punk. Para a própria surpresa, Renato não passou no vestibular da UnB e resolveu estudar jornalismo no UniCeub. Já na faculdade, ele conseguiu um emprego como repórter no “Jornal da Feira”, programa de rádio do Ministério da Agricultura. Durante o curto tempo em que exerceu a profissão, Renato se mostrou muito sensível ao sensacionalismo da mídia e criticou duramente jornalistas que não levavam sua obrigação social a sério.
Após dois anos como aluno jornalismo e professor de inglês na Cultura Inglesa, Renato abandonou o curso, pois decidiu se dedicar integralmente ao “Aborto Elétrico”, banda de rock da qual também participavam Felipe Lemos, Flávio Lemos e André Pretorius. O Aborto teve vida de quatro anos e seu desmembramento resultou na formação de duas bandas: a “Capital Inicial” e a “Legião Urbana”, através da qual Renato Manfredini foi imortalizado como Renato Russo.
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