Em 1° de dezembro de 1955, ela simplesmente se recusou a levantar-se do banco. Mesmo nos Estados Unidos da época – encoberto de políticas racistas, quando era proibido que negros se sentassem nos ônibus se brancos estivessem em pé –, uma introvertida falou mais alto e apenas se recusou a levantar-se.
Depois de ser presa por questionar a manutenção de um sistema racista legalizado, Rosa Parks se tornou um símbolo de resistência negra contra políticas opressivas. Posteriormente, o líder desse movimento, Martin Luther King Jr., levou a luta negra a patamares nunca vistos, até então, na história da nação norte-americana.
Quando o motorista perguntou: “Por que você não se levanta?”, ela respondeu: “Eu não deveria ter que me levantar”. A faísca dessa verdadeira mudança de paradigma foi Parks. A mulher significou a coragem e a audácia que todas as grandes mudanças precisam para acontecer. É difícil saber o que exatamente passava pela cabeça dela naquele momento, mas sua atitude pioneira pode ter sido causada por uma característica pouco valorizada hoje em dia: a introspecção.
A introspecção e o mundo: o que aconteceu?
“Seja mais extrovertido”. Essa expressão é muito famosa. Carl Jung criou o termo em 1921, e sua importância é legitimada graças a atualidade que a frase tem até hoje.
Em um mundo que celebra a todo instante a extrospecção – desde as idades mais tenras –, aprende-se que a socialização é o único modo de conseguir sucesso em empreitadas da vida. Porém, a autora do livro “O poder dos quietos”, Susan Cain, defende que essa supervalorização da extroversão foi criada por um movimento histórico e pode estar deixando marcas permanentes na sociedade: “Fomos incitados a desenvolver uma personalidade extrovertida por razões claramente egoístas: uma maneira de aparecer em meio à multidão em uma sociedade nova, anônima e competitiva.”
Desde a escola, as crianças são condicionadas a ficar em mesas com um grupo de outras crianças realizando atividades em conjunto. Trabalhar e desenvolver suas habilidades individualmente é uma opção remota, e a partir disso é possível analisar a raiz do problema. O grande “X” da questão não é o ato de socializar que as escolas querem empreender aos pequenos. O complexo nessa equação é o fato de que atividades, que necessitam de análise e reflexão crítica, estão sendo condicionadas às opiniões dos outros em prol da extroversão.
Em entrevista ao portal espanhol El País, o filósofo e autor do livro “A arte de ficar só”, Francesc Torralba, defende que ter um momento a sós pode ser a chave para uma vida saudável: “Para mim a solidão representa a oportunidade de revisar nosso gerenciamento, de projetar o futuro e avaliar a qualidade dos vínculos que construímos. É um espaço para executar uma auditoria existencial e perguntar o que é essencial para nós, além das exigências do ambiente social.”
Ser quieto é bom
O grande desafio é tentar rever a importância que pessoas introvertidas têm para a comunidade. Rosa Parks não é a única grande personalidade introspectiva que mudou o mundo. Sem a introversão, não teríamos a Teoria da Relatividade, o Peter Pan, a Teoria da Evolução, o Google, a Teoria da Gravidade, o Jurassik Park ou o Harry Potter. Suscetíveis a diferentes estímulos, os introvertidos têm uma capacidade acentuada de autorreflexão e análise crítica. A partir do momento em que aprofundam o pensamento a respeito do mundo, eles se tornam mais criativos e analíticos. Além disso, são menos vulneráveis à solidão, ou melhor, sabem encará-la de uma forma distinta, quase positiva.
E se todas essas características fossem perdidas ou reprimidas só porque não se encaixam no objetivo do idealizado mundo extrovertido?
Equilíbrio é o segredo
A grande verdade é que extrovertidos e introvertidos se completam – vide Steve Jobs e Steve Woznia. Juntos, eles conseguiram fazer mais. Isso, além de entender o fato de que ninguém é essencialmente intro ou extrovertido – inclusive, alguns especialistas defendem a existência de ambivertidos, que seria a junção de ambos. Adriana Gomes, psicóloga e especialista em carreira, em uma entrevista para a revista Exame, diz: “Introvertidos e extrovertidos são perfis complementares, que contribuem cada qual à sua maneira para a produtividade de um grupo.”
Ser ou respeitar o próximo é a mensagem. A ação mais íntima e longe dos holofotes pode ser a mais relevante. No fim das contas, simplesmente não levantar do banco do ônibus pode mudar tudo.
Texto por Ronayre Nunes Arte por Camila Alves
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