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Infância não rima com desconfiança

Por Mariana Lozzi

Nós, leitores, constantemente somos advertidos quanto ao perigo de nos deixarmos manipular pela mídia. Tudo começa nos anos de adolescência, quando pais, amigos mais experientes e professores fazem nascer em nós algo chamado senso crítico. E é aí que, pela primeira vez, a desconfiança surge como artefato preventivo, imprescindível na tal “sociedade pós-moderna” na qual somos acusados de viver.

O cuidado, às vezes até carinhoso, com que jornalistas leem matérias de outros jornalistas é parte de um ritual sedimentado junto aos conhecimentos mais primitivos sobre a profissão, como a noção do que é um lead. Quem sabe excessivamente desconfiados, quem sabe ainda muito ingênuos, adotamos o papel de ouvintes críticos com base na premissa que por trás de toda matéria existe uma intenção.

E viva nós, universitários, jornalistas, adultos sensatos que entendemos bem das velhas engrenagens que fazem rodar as notícias. A imparcialidade vira uma palavra carregada de poesia, de uma beleza necessária – e mítica.

Mas, por mais importante que seja o ceticismo, esquecemo-nos que ele é adquirido – e tarde. Na infância, época do impossível, não é comum desconfiar e, justamente por isso, a imaginação vive um período de fertilidade abismal. Quando a criança entra em contato com uma história ela vive suas palavras, acredita nela.

E sempre houve quem entendesse tão bem do incrível na aceitação da criança que a usou a seu favor. Nas épocas da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria, por exemplo, diversos desenhos ensinavam aos cidadãos encubados em crianças da mais tenra idade o que era e o que não era cabível, aceitável, perdoável. Assim, transformavam países, empresas e pessoas em vilões terríveis e coroavam outros com o papel de herói.

Abaixo, estão alguns vídeos de desenhos animados que, no final dos anos 30 e inicio dos 40, foram responsáveis por incubar medo preconceitos em crianças da época (hoje nossos avós?).

O desenho acima foi ao ar em 1943 e, nele, o personagem da Disney “Pato Donald” é um soldado nazista que leva uma vida miserável. Ele alterna um trabalho extenuante produzindo bombas à sessões de bajulação a um retrato de Hittler. Donald chega a uma catarse que lembra o estado psicótico a que Charles Chaplin foi submetido em “Tempos Modernos” e, no final, acorda em um quarto decorado com as cores da bandeira americana. Aliviado, Donald diz: I’m glad to be a citizen of the United States of America (estou feliz por ser um cidadão dos Estados Unidos da América).

O segundo desenho (1941) foi um dos primeiros episódios de “Marinheiro Popeye”, personagem criado em 1929 nas tiras de quadrinho “Timble Teathre”. Influenciado pelo ressentimento americano após o Pearl Harbor, o desenho imprime nas mentes infantis uma imagem dos japoneses como pessoas traiçoeiras e apalermadas, em contraste com a atitude bondosa do protagonista.

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