Por Luiza Garonce
O Pasquim chegou às bancas em 1969. Idealizado por artistas e intelectuais cariocas, o tabloide tinha uma visão crítica sobre o regime ditatorial da época. Subversivo e irônico, utilizava mensagens bem humoradas de duplo sentido. A ambiguidade das informações confundia os repressores e permitia que o jornal escapasse da censura. Como porta-voz popular, O Pasquim condenava o moralismo da classe média e escancarava a desigualdade social por meio de charges e cartuns de humor negro.
Primeira edição de “O Pasquim”
O Brasil vivia o auge da repressão política. Em 1968, após manifestações populares que pediam pela redemocratização, a Junta Civil-Militar anunciou o Ato Institucional número 5. Além de prever poderes quase irrestritos ao presidente e a suspensão de direitos civis, o AI-5 instaurou a censura prévia de músicas, peças de teatro, livros, revistas e jornais. As publicações brasileiras, mesmo as que apoiaram o golpe militar inicialmente, viveram um período de terror, com invasões e boicote de conteúdo.
Importantes artistas brasileiros, contrários ao regime e à censura prévia, fizeram parte d’O Pasquim. Tarso de Castro, Jaguar, Sérgio Cabral, Ziraldo, Millôr, Chico Buarque, entre outros, levaram criatividade à população que vivia tempos de extinção do direito de liberdade. Os textos pouco editados e a diagramação avessa aos padrões estéticos eram as formas mais efetivas de o tabloide transmitir informação e se distanciar do cultismo exagerado da época. Crítico e inovador, O Pasquim conseguiu dar voz às indignações populares. Ultrapassou o bairro de Ipanema onde nasceu e alcançou circulação nacional.
Renomado cartunista brasileiro, Henfil utilizou O Pasquim como espaço para a arte voltada ao protesto. Nas histórias em que retratava a caatinga brasileira, três personagens revelavam a disparidade socioeconômica do país, o racismo e a hipocrisia política: o cangaceiro Zeferino, o bode Francisco Orelana, animalização dos intelectuais “devoradores de livros” e passivos diante dos males sociais, e Graúna, ave pequena, ingênua e otimista na qual estava a maior parte da crítica dos cartuns.
Graúna
Graúna, Zeferino e o bode Francisco Orelana
A irreverência do jornal incomodou os militares que, em 1970, prenderam todos os profissionais da redação. Alguns integrantes foram exilados. Apesar da repressão, o jornal continuou ativo até depois da redemocratização do país. Ainda hoje, O Pasquim é o maior exemplo da mídia alternativa brasileira. O jornal não revolucionou apenas a maneira de o povo se manifestar através da imprensa, como também o jeito de fazer jornalismo. A última edição do tabloide foi publicada em 11 de novembro de 1991.
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